SÁBADO
Sábado
tinha magia. Não era nem domingo, com sua apatia e nem dia de semana com feira,
que significava vida que segue. Era um dia especial. Domingo era um dia morno,
em que, além da missa nada acontecia. Era dia de preguiça, dia ver televisão de
14 polegadas, azul que ficava na sala, em cima de móvel vermelho, com divisões
de vidro onde sua mãe guardava suas louças de chá. A bem da verdade, nunca
tomaram chá naquelas coisas. No máximo, sua mãe servia café nas xícaras, quando
recebiam visitas. O chá que tomavam lá, era de mercurina ou de chapéu de
couro para fazer desaparecerem as perebas das pernas e “purificar o sangue”.
Sua mãe possuía um exemplar do livro As Plantas
Curam. O que me faz supor que esse costume tenha vindo do seu avô materno,
pois ele era curandeiro popular. Sua vida provocou em Joana Carolina um
profundo encantamento quando soube, através dos parentes, que ele não só ia às
casas das pessoas trabalhando para a cura delas, mas também as levava para sua
própria casa quando elas não tinham lugar para ficar ou não tinham quem lhes
tivesse cuidado. Isto acontecia nas paragens do Rio Chopotó, no final do século
XIX e início do XX. Que vida extraordinária! Joana amou seu bisavô materno com muita
ternura, mesmo sem nunca ter-lhe conhecido.
Voltemos
ao domingo, ou melhor, ao sábado! Sábado era dez ou top, como se diz
hoje. Entretanto, não significa que não tinham obrigações, ou seja, tarefas
específicas de sábado. Cedo, eles deviam ir ao pasto buscar alecrim para fazer
vassouras e depois varrer os terreiros. Outra tarefa: limpar o galinheiro. E isto
significava buscar a cavadeira e com ela desgrudar as titicas das galinhas do chão do galinheiro para depois varrer e
carregar no carrinho de mão o produto total e deixar na horta para “curtir”. Ah,
mas depois dessas tarefas!
Após
o almoço, todos estavam liberados até quatro da tarde! Então, podiam ir pescar.
Pegavam minhocas no quintal e o anzol já estava pronto na vara de bambu. O córrego
passava no quintal. O sol brilhava forte e esquentava as cabeças. Sua mãe dizia
que “não há sábado sem sol, domingo sem missa e segunda sem preguiça”. Era verdade.
Por mais que chovesse, no sábado o sol abria. Quando não iam pescar,
encontravam com as crianças dos vizinhos para brincarem, e isso significava
qualquer coisa. Desde andar á toa pelos pastos, fazer malabarismos no paiol,
montar na burrinha de embaúba ou se pendurar numa corda que estava amarrada em
uma árvore e se balançar em cima de um abismo, não muito grande, é verdade, mas
suficiente para que, se caíssem provocar traumatismo craniano.
Depois
do divertimento vinha a obrigação. Ás quatro horas eles tomavam banho e iam
para a cidade, onde na igreja, havia catecismo. Aprendiam que deviam amar a Deus sobre todas as coisas e ao
próximo como a nós mesmos. O mandamento ficava de cor na cabeça, mas muito
tempo mais tarde que Joana veio a pensar o que isso podia significar.
À notinha,
voltavam pelo caminho de dois quilômetros para casa. À luz do lampião a gás,
jantavam e depois dormiam. O sono era tranquilo, sono de quem viveu o sábado e
não apenas o viu passar.
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