BIDU
Ele ouviu passos ao longe e ficou arredio. Logo seu instinto
o advertiu que podia correr perigo e uma inquietação desassossegou- lhe os
modos: rosnou baixinho, enquanto girava em torno de si mesmo, depois permaneceu
em alerta e aguardou. Os passos arrastados foram ficando cada vez mais
próximos, então, ele se encolheu atrás de uma moita de capim, que ficava em um
lote vago e aguardou. À medida que os passos se aproximavam, a figura ia
crescendo, crescendo.
- Oi
amiguinho! Trouxe uma surpresa para você.
Aquele ser
jogou pedaços de pão, bem pertinho dele, mas não teve coragem de buscar, para
não se expor.
- Come
amiguinho! Come!
Ele desconfiava! Lágrimas de desejo caiam de
seus olhos enquanto a boca salivava pelo alimento, no entanto, permaneceu firme,
paralisado pelo medo.
Depois de observá-lo mais um pouco, o ser se foi.
- Tchau
amigo!
Sempre
passara por aquela rua e havia notado o cachorrinho arredio, com cara de ter
sido maltratado nas ruas por outros cachorros maiores e por seres humanos.
Muito meigo, embora arisco.
O cachorro,
por sua vez, esperou que ele atingisse uma distância segura e devorou os
pedaços de pães. Com a barriga cheia, dessa vez dormiu tranquilo, só mesmo
incomodado, às vezes, pelos cachorros do bairro que passavam pela rua.
No outro
dia, aquela figura estranha, trouxe-lhe mais pão e água. E assim aconteceu
durante a semana. E por fim, o cachorrinho já esperava por ele, ansioso e
começou a confiar em seu amigo. Comeu tranquilamente enquanto este lhe
observava e depois o acompanhou, entre meio desconfiado e carente. No entanto,
quando chegaram ao portal de casa, ele não quis entrar, ainda muito receoso.
Sérgio não desanimava. Aquele cãozinho havia conquistado seu coração.
Abandonado, sofrido e sem ninguém. Queria cuidar dele e conquistar-lhe a
amizade. Além do mais, ele poderia vigiar sua casa, enquanto estivesse fora,
cuidando de seus afazeres.
Por mais uma
semana o animalzinho dormiu no portão, sem coragem para entrar, dividido entre
a necessidade de cuidados e amizade e o temor de novos sofrimentos. Até que,
finalmente, foi vencido pela persistência e teimosia de Sérgio – adjetivos que
mais o caracterizavam. E o cachorrinho não se arrependeu, pois além dos
adjetivos acima citados, Sérgio também era reconhecido pela lealdade e ajuda
aos amigos que precisassem.
Sempre que
eu entrava em sua casa, o Bieber, o coitadinho recebeu esse nome em um primeiro
momento, rosnava comigo, achava que eu era uma intrusa em sua bela vidinha com
o Sergio. Aliás, não só comigo, mas com qualquer pessoa que ousasse entrar em
seu mundo. Entretanto, Bidu (é importante mencionar que seu nome foi trocado,
já que ninguém conseguia pronunciar corretamente aquela coisa. Lindo nome!)
obedecia e amava o Sérgio, que havia lhe dado uma coleira, ração e lhe ensinado
a não entrar dentro de sua casa. Sentia-se seguro junto a ele. Sempre que ele
ligava o carro, o cachorrinho já se dirigia aonde a coleira ficava, pois Sérgio
o prendia antes de sair de carro para que ele não fugisse de casa e fosse
maltratado nas ruas.
Aquele dia
não entendeu quando Sérgio saiu, deixando o carro. Ele pálido era acompanhado
de uma amiga. Entendeu menos ainda quando no dia seguinte a amiga veio lhe dar
água e ração, mas ficou agradecido, mesmo observando só de longe. E assim
aconteceu nos dias seguintes. Agora já apoiava a cabecinha no colo da amiga
para ganhar carinho, mas sentia saudades de outra pessoa e seus olhinhos
olhavam interrogando.
Esperou
muitos dias, vieram muitas pessoas. Todas lhe davam carinho...ração e água, mas
Bidu não entendia. Até que um dia, foi colocado em um carro e com muito carinho
foi levado...mas Bidu ainda espera e procura entender porque ficou sozinho
novamente, porque não mais ouviu aquela voz que ele tanto amava?
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